quinta-feira, 3 de junho de 2010

Olga




Olga é um filme brasileiro realizado em 2004 pelo diretor Jayme Monjardim, inspirado na biografia escrita por Fernando Morais sobre a alemã, judia e comunista Olga Benário Prestes.

Ficha Técnica:

Nome original: Olga
Origem: Brasil
Realizado em: 2004
Gênero: Drama
Duração: 141 min.
Classificação: 14 anos
Direção: Jayme Monjardim
Elenco: Camila Morgado (Olga Benário), Caco Ciocler (Luís Carlos Prestes), Fernanda Montenegro (Leocádia Prestes), Osmar Prado (Getúlio Vargas), Floriano Peixoto (Filinto Müller).

Sinopse:

Num dia frio, uma jovem adolescente contempla a neve caindo. Sorri. À sua frente, uma fogueira. Crianças brincam de roda num local próximo a ela. Seu pai a observa a uma certa distância. De repente, num gesto impetuoso, ela salta sobre o fogo dizendo "se doer, eu não vou chorar". Assim começa o filme Olga, de Jayme Monjardim.

No início, a história da jovem e entusiástica militante de origem burguesa arrebatada pelo ideal revolucionário, fria, dura, "com nervos de aço", que rompe com a família e se dispõe a morrer pela causa do proletariado parece igual a de muitas outras que seguiram essa trajetória.

Apesar da fotografia impecável e de uma rápida sucessão de episódios que retratam um pouco da história do partido comunista alemão, a coluna Prestes, a intentona comunista e a ditaduraVargas, entremeadas por cenas de romantismo que incluem uma viagem num transatlântico, em muito semelhantes às do Titanic de James Cameron, o princípio do filme deixa no espectador uma sensação de algo próximo do inverossímil.

Somente quando a protagonista, vivida pela atriz Camila Morgado, é detida e deportada para a prisão na Alemanha é que o drama da personagem adquire força e passamos a compreender o ser humano por detrás da militante.

E talvez seja exatamente este o efeito desejado. O filme muda junto com a personalidade de Olga. Enquanto o ideal revolucionário é pintado com cores de um certo racionalismo, não podemos compreendê-lo em sua dimensão mais ampla. Somente uma Olga transformada pela experiência do amor e da maternidade pode dar-nos a exata noção de porque algumas pessoas comuns e ao mesmo tempo especiais como ela, Prestes, Dna. Leocádia e muitas outras movem montanhas por suas convicções.

A figura da mulher, inicialmente sufocada por um estereótipo de uma militante sem tempo para a "felicidade pessoal", irrompe em toda a sua beleza em cenas como aquela em que Olga proclama à imprensa que vai ser mãe de um filho de Prestes.

Atos aparentemente banais como tecer casaquinhos de crochê para o futuro bebê na prisão humanizam a protagonista que, casualmente, em uma missão determinada pelo partido, passou pelo Brasil e marcou para sempre a história do país.

Num momento em que se decretou o fim das ideologias, Olga é um filme, no mínimo, necessário. Convence sobretudo como documento de uma época ainda não completamente desvendada pelos historiadores. Reacende questões como o porquê da perseguição nazista aos judeus e sugere que a deportação de Olga, em lugar de um desejo de Vargas, pode ter sido fruto de uma desavença pessoal entre Prestes (Caco Ciocler) e Filinto Müller (Floriano Peixoto), chefe de polícia do então presidente. O filme é também um convite ao livro homônimo de Fernando Moraes, que sai enriquecido pelos detalhes fictícios ou não que o roteiro de Rita Buzzar acrescenta à história.

Especialmente comoventes são as cenas vividas na prisão em Berlim, em que Olga permanece com a filha, nos primeiros meses de vida da criança, até que, sem que a mãe saiba, a menina seja entregue aos cuidados da avó e da tia. Anita Leocádia, o nome do bebê, é uma dupla homenagem: a Anita Garibaldi - outra figura histórica do Brasil já retratada por Jayme Monjardim na mini-série global A casa das sete mulheres (2003) - e a Dna. Leocádia, mãe de Prestes, revivida na interpretação magistral de Fernanda Montenegro.

Biografia:

Nascida Olga Gutmann Benário em Munique, era filha do advogado Leo Benário e da socialite Eugénie Gutmann Benário, em uma família judia alemã de classe média. Ingressou ainda jovem no movimento comunista, em 1923, com apenas quinze anos, juntando-se a organização juvenil do Partido Comunista Alemão (KPD), a Liga Juvenil Comunista da Alemanha (KJVD). Pouco depois, mudou-se para Berlim com o então namorado Otto Braun, experiente militante comunista,devido a conflitos ideológicos com seu pai, que era membro ativo do Partido Social-Democrata.

Após a queda da monarquia, instaurou-se um regime formalmente republicano na Alemanha, a chamada República de Weimar. O regime, no entanto, jamais foi aceito pela direita, que o considerava um produto da "traição" do Tratado de Versalhes, nem pela extrema-esquerda comunista, que, esmagada politicamente na repressão ao Levante Spartakista de 1919, quando foi assassinada Rosa Luxemburgo, desejava uma aliança política entre uma Alemanha comunista e a União Soviética. Esse conflito entre a direita e esquerda marcou esse período turbulento da história da Alemanha, com lutas armadas entre milícias paramilitarese homicídios políticos.

Neste clima político, em Berlim, Olga ascende dentro do movimento revolucionário comunista depois dos conflitos de rua contra milícias de extrema-direita no bairro de Kreuzberg, próximo a Neukolln.Ela foi presa no mesmo dia que Braun, sendo acusados de alta traição à pátria.Ela logo é solta, mas Braun, não. Junto com seus colegas de militância, planeja então o assalto à prisão de Moabit que libertaria Braun. Logo depois, ambos fogem para a União Soviética, onde Olga, já como quadro valioso, recebe treinamento político-militar na Escola Lenin, trabalhando como instrutora da Seção Juvenil da Internacional Comunista. Separa-se de Braun em 1931. Recebe os codinomes de "Frida Leuschner", "Ana Baum de Revidor", "Olga Sinek", "Maria Bergner Vilar" e "Zarkovich".

A Internacional Comunista, desde o fim dos anos 1920, havia seguido na Alemanha uma política ultra-esquerdista, fundada na recusa a coligar-se com os social-democratasnuma frente única contra o nazismo, que havia contribuído para a chegada de Adolf Hitler ao poder, e a presença de militantes comunistas alemães como Olga no território daUnião Soviéticaconstituía um embaraço para Josef Stalin que começou a pensar em engajá-los em alguma espécie de empreendimento que pudesse de alguma forma compensar o fracasso da política stalinista na Alemanha.

Luís Carlos Prestes, que desde 1931 estava residindo na União Soviética, é, em 1934, é finalmente aceito nos quadros do Partido Comunista Brasileiro (PCB), por pressão doPartido Comunista da União Soviética. Sendo eleito membro da comissão executiva da Internacional Comunista (IC), volta ao Brasil, via Nova Iorque, como clandestino, em dezembro do mesmo ano, acompanhado de Olga Benário, também membro da IC, passando-se por marido e mulher. Seu objetivo era liderar uma revolução armada, com o apoio de Moscou.

A política comunista da época - decidida no VI Congresso da Internacional Comunista - favorecia movimentos do tipo frente de Esquerda em países do Terceiro Mundo, tendo por objetivo a realização de um programa de democratização política interna e de defesa da independência nacional contra o imperialismo, e Prestes parecia aos comunistas a figura adequada para liderar esta espécie de movimento no Brasil. Antes de aprovar a insurreição, a Internacional Comunista estava cética do sucesso de uma revolução no Brasil. Mas o Partido Comunista Brasileiro havia exagerado consideravelmente a extensão da sua influência e capacidade de revolucionária e, assim, fornecido à Internacional Comunista a perspectiva - completamente errônea, como se veria - de um levante comunista vitorioso que compensasse, de alguma forma, a recente derrota na Alemanha.

Na época, Moscou criara em Montevidéu, Uruguai, o Secretariado Latino Americano que operava clandestinamente e queria aproximar as organizações comunistas da América Latina de Moscou. Olga e Prestes eram apoiados financeira e logisticamente através desta organização. Após o fracasso da Intentona Comunista e a descoberta destas operações, o Uruguai rompeu relações com a União Soviética, no final de 1935.

Prestes seria acompanhado por um pequeno grupo de quadros, encarregados de auxiliá-lo na preparação da insurreição. Eram eles Inês Tulchniska, Abraham Gurasky "Pierre", o alemão Arthur Ernst Ewert (que seria mais conhecido no Brasil pelo seu codinome de Harry Berger), sua esposa alemã de origem polonesa Elise Saborovsky, o belga Leon Jan Jolles Vallée, Boris Kraevsky, o argentino Rodolfo José Ghioldi, Carmen de Alfaya, a própria Olga Benário, Johann de Graaf, Helena Kruger, Pavel Vladimirovich Stuchevski, Sofia Semionova Stuchskaia, Amleto Locatelli, "Marga", Mendel Mirochevski, Steban Peano, Maria Banejas, norte-americano Victor Allen Baron, Marcos Youbman, "Carmen". Pavel Vladimirovich Stuchevski, que chefiava o aparelho do Komintern no Rio de Janeiro, coordenava as atividades de sete outros brasileiros de menor projeção dentro da Organização.

Prestes e Olga chegaram ao Brasil com documentos falsos em abril de 1935, fingindo serem um casal português mas se mantendo na clandestinidade. O país havia se reconstitucionalizado desde 1934, mas com o Presidente Vargas na situação ambígua de presidente eleito pelo voto indireto da própria Constituinte.

Prestes encontra o movimento recém-constituído denominado Aliança Nacional Libertadora (ANL), frente política revolucionária comunista de caráter antifascista e anti-imperialista que congregava tenentes, socialistas e comunistas descontentes com o Governo Vargas. O movimento contestava o integralismo de Plínio Salgado, de cunho filofascista. Mesmo clandestino, Prestes é calorosamente aclamado presidente de honra da ANL em sua sessão inaugural no Rio de Janeiro. Prestes procura então aliar o enorme crescimento da ANL, que o prestigia, com a retomada de antigos contatos no meio militar para criar as bases que julgava capazes de deflagrar a tomada do poder no Brasil. Em julho de 1935, divulga um manifesto incendiário, apelando para os sentimentos nacionalistas das classes médias exigindo "todo o poder" à ANL e a derrubada do governo Vargas.

Vargas, no entanto, apoiando-se numa política de defesa da ordem, imediatamente aproveita a oportunidade e declara a ANL ilegal, o que não impede Prestes de continuar a organizar o que acabou por ficar conhecido como a Intentona Comunista.

Os preparativos insurrecionais caminhavam quando, em novembro daquele ano de 1935, um levante armado estourou na cidade de Natal, motivado principalmente por fatores locais. Prestes ordenou, então, que a insurreição fosse estendida ao resto do país.Porém, apenas algumas unidades militares de Recife e Rio de Janeiro se levantaram. O governo brasileiro logo controlou a situação e desencadeou forte repressão sobre os setores oposicionistas. Deve-se lembrar que os planos de Prestes e Olga eram de tomar o poder de Vargas através de uma insurreição armada, e o governo não mediu esforços para suprimi-la.Muitos líderes comunistas são presos, alguns deles amigos de Olga e Prestes, como o casal de alemães Artur e Elise Ewert, conhecida como Sabo. Ambos seriam brutalmente seviciados pela polícia brasileira, sob o comando de Filinto Müller, e Artur perderia definitivamente sua sanidade mental no processo.

Durante alguns meses, Prestes e Olga conseguiram ainda viver na clandestinidade. No início de 1936, tentando encontrar responsáveis pelo fracasso do levante, Prestes manda matar a moça de 18 anos Elza Fernandes, namorada do secretário-geral do PCB. Prestes suspeitava que ela fosse informante da polícia, o que mais tarde se provou um engano.William Waack, que estudou arquivos do regime soviético, alega que Olga não se opôs à decisão, baseando-se em informações de um ex-agente soviético que chefiava as operações clandestinas no Rio de Janeiro. William Waack diz: "Prestes e Olga eram soldados do Partido, e a esses soldados não se admitiam crises de consciência."

Em março de 1936, foram capturados pela polícia. Olga é levada para a Casa de Detenção, posta numa cela junto com mais de dez mulheres, muitas delas conhecidas suas. Aí, descobre estar esperando uma filha de Luís Carlos Prestes. Logo vem a ameaça de deportação para a Alemanha, sob o governo de Hitler. Seria a morte para ela: além de judia, comunista.Começa na Europa um grande movimento pela libertação de Olga e Prestes, encabeçado por D. Leocádia e Lígia Prestes, respectivamente a mãe e a irmã de Luís Carlos Prestes.

O julgamento de Olga foi feito segundo os termos formais da ordem constitucional definida pela constituição federal, atendendo a um pedido de extradição do governo nazista. Nos termos da constituição em vigor, o julgamento era legal. O advogado de defesa de Olga pediu um indulto (Habeas Corpus), argumentando que a extradição era ilegal pois Olga estava grávida e sua extradição significaria colocar o filho de um brasileiro sob o poder de um governo estrangeiro. Havia também o aspecto humanitário da permanência dela no país: não obstante os campos de concentração nazistas, à época, não funcionarem como aparatos de extermínio, era de conhecimento público que eram centros de detenção extrajudicial onde os internos eram tratados com intensa crueldade.

Não obstante tudo isto, o Supremo Tribunal Federal aprovou o pedido de extradição, Vargas não decretou indulto e Olga foi deportada para a Alemanha, juntamente com a amiga Sabo. Getúlio Vargas decretou o estado de sítio após a Intentona como resposta à radicalização político-ideológica no Brasil tanto da direita e da esquerda, polarização que estava acontecendo também fora do país.Apesar de o contexto em parte justificar a decisão, em 1998 o então presidente do Supremo,Celso de Mello, declarou que a extradição fora um erro: "O STF cometeu erros, este foi um deles, porque permitiu a entrega de uma pessoa a um regime totalitário como o nazista, uma mulher que estava grávida."

Após a decisão, Olga foi transportada para a Alemanha de navio, o cargueiro alemão La Coruña, apesar dos protestos do próprio capitão pela violação do Direito Marítimointernacional - afinal, Olga já estava grávida de sete meses. Quando o navio aportou em 18 de outubro de 1936 diretamente na Alemanha, para evitar protestos em outros portos, oficiais da Gestapo já esperavam por ela, para levá-la presa. Não havia nenhuma acusação contra ela, pois o caso do assalto à prisão de Moabit já prescrevera. No entanto, a legislação nazista autorizava a detenção extrajudicial por tempo indefinido ("custódia protetora") e Olga foi levada para Barnimstrasse, a temida prisão de mulheres da Gestapo, onde teve a filha, que denominou de Anita Leocádia, futura historiadora, professora-adjunta da Universidade Federal do Rio de Janeiro(UFRJ).Anita ficou em poder da mãe até ao fim do período de amamentação e, depois, foi entregue à avó, D. Leocádia, em consequência das pressões da campanha internacional dirigida, como já dito, por Lígia Prestes e pela própria D. Leocádia, que morreria no exílio no México.

Olga foi transferida para o campo de concentração de Lichtenburg nos primeiros dias de março de 1938, e em 1939 seria transferida para o campo de concentração feminino deRavensbrück. Aqui, as prisioneiras viviam sob escravidão e eram sujeitas a experiências pelo médico Karl Gebhardt. Relatos de sobreviventes contam que, durante o seu tempo em Ravensbrück, Olga organizou atividades de solidariedade e resistência, com aulas de ginástica e história.

Com a Segunda Guerra Mundial e sem mais possibilidades de recursos à opinião pública, Olga seria um alvo óbvio para as políticas de extermínio nazistas: na páscoa de1942, já com 34 anos de idade e quase quatro anos depois de transferida para Lichtenburg, Olga foi enviada para o campo de extermínio de Bernburg, onde morreria.

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